Espírito nos Natais passados
Foto usada a partir daqui |
Passou o Natal e, agora me lembro, não enviei uma mensagem
ou telefonema. Limitei-me a receber. Não quis saber de nada nem de ninguém. Estou
com pouca ou nenhuma paciência para estas épocas, cada vez mais fingidas, frívolas
e superficiais. Cada dia mais forçadas.
Hoje fui trabalhar enjoado. Pergunto-me para que temos
necessidade de comer tanto nestes dias. Não sei se também por isso, mas estou
com o espírito a condizer com o meu estômago. Aziado, amargo,…. Blhac! Blhac!
E…. Blhac! A “boca sabe-me” a papel de música (que como toda a gente sabe é um
descritor para a oxidação)!
Sinto-me um verdadeiro Grinch.
Não suporto olhar para as decorações. Não suporto o relembrar das tradições.
Não suporto a memória dos Natais da minha inocência.
Sem muito esforço, sinto o cheiro das azevias e coscurões, feitos no primeiro dia de férias escolares. O deliciosamente mau arroz branco da avó Isabel. A negação constante da avó Elisa. Os sonhos. O
bacalhau. O aquecedor a gás. Os vinhos que o meu avô Joaquim comprava a granel (em
garrafões) para depois envasilhar, meticulosamente, em garrafas de 5 estrelas
(as melhores, segundo ele!). Eram nestes dias bebidos em copos sem peneiras. Também não havia esforço e moderava-se na contenção. Tudo numa complexa simplicidade de sabores, aromas e sensações que ainda sinto cravados na memória olfactiva.
O momento perfeito das 23 horas com abertura dos
presentes. As crianças (eu, portanto!) sabiam que o pai natal não existia e
sabiam também que aquele embrulho vinha da mercearia da esquina. Local onde se
comprava tudo, desde o avio do mês aos presentes de aniversário e Natal.
Depois, saltava para a mesa a frigideira de tordos que o avô fazia questão de fritar. Eram caça sua ( foi o maior caçador que conheci!) e recordo que ele, juntamente com o meu pai, me tentavam ensinar como se comiam, à homem, estes pequenos pássaros. Entre rizos diziam: “Então tu não vês que isto é para comer tudo? Ossos e tudo!” Mas eu não era capaz (ainda hoje não sou!). O cheiro da fritura misturava-se com o sabor especiado da carne e um leve travo de chumbo que sentia pouco antes de descobrir na boca a esfera que matara o bicho. Ainda hoje sou capaz de jurar que era real, embora tenha a certeza de que não passava de sugestão.
Depois, saltava para a mesa a frigideira de tordos que o avô fazia questão de fritar. Eram caça sua ( foi o maior caçador que conheci!) e recordo que ele, juntamente com o meu pai, me tentavam ensinar como se comiam, à homem, estes pequenos pássaros. Entre rizos diziam: “Então tu não vês que isto é para comer tudo? Ossos e tudo!” Mas eu não era capaz (ainda hoje não sou!). O cheiro da fritura misturava-se com o sabor especiado da carne e um leve travo de chumbo que sentia pouco antes de descobrir na boca a esfera que matara o bicho. Ainda hoje sou capaz de jurar que era real, embora tenha a certeza de que não passava de sugestão.
Fiquei com a toalha de mesa dos Natal na casa da minha avó, mas perdi parte as pessoas que se sentavam à sua roda. Uma troca parva e injusta.
Foi um ano difícil.
Sim!
Talvez seja disso!
Sim!
Talvez seja disso!
Comentários
ao fim de muitos posts lidos, este hoje tocou-me mais um pouco e resolvi comentar.
Como eu me identifico com as tuas palavras...
O Natal hoje em dia a mim não me diz nada. Prendas? Decorações? árvore de natal? beijar o menino na missa?...Esqueçam, isso ficou tudo para trás.
Será a idade, aquela velha doença?
Será da tão falada CRISE?
Serão saudades do tempo de criança?
se calhar é tudo isto e muito mais.
se calhar não é nada disto, é só um dia mau.
Deixa lá, bebamos um espumante, pode ser que passe esta azia...
um abraço de um adegueiro do Ribatejo
Deixa-me muito feliz saber que acompanha o blog e que gostou do que leu.
Concordo consigo: "se calhar é tudo isto e muito mais".
Mas é como diz, bebemos um espumante e afogamos esta azia no vinho.
Você saberá bem que, na pior das hipóteses, na nossa profissão, vai-nos valendo isso! eh! eh!
Um forte abraço
Hugo Mendes
Um forte abraço
Rui