Hugo Mendes Lisboa 2018 - com ou sem FML?

Sexta feira fui à adega e provei o vinho. Isso mesmo, um São Martinho atrasado mas sem castanhas*.
Estive quase duas semanas sem provar o gajo. Uns enchimentos na Murta têm-me tomado os dias (talvez tenha a estagiar, já em garrafa, o melhor tinto que já ajudei a fazer ali) se bem que nesta fase, não é grave que tenha passado este tempo sem o visitar.

O vinho encontra-se fechado, que é como quem diz, em cuba atestada e protegido com sulfuroso (sim... sou desses bandidos que usam sulfuroso no vinho e não vou deixar de o fazer, embora de tudo faça para minimizar o seu uso). Gosto que os vinhos descansem depois da fermentação, com mínimo de intervenção a fim de conseguirem mostrar-me com clareza, lá para meio de Dezembro, para o que estão guardados. Este ano porem, dado a baixa graduação alcoólica que têm, pedi apenas que fosse iniciada a batonage em barrica e nas cubas isoladas de Vital e Fernão Pires. A cuba grande,a nossa "Vitalidade" manteve-se sem ser mexida todo este tempo.

Ora bem. Como se lembram, o Hugo Mendes Lisboa 2018 tem 2/3 de inox para 1/3 de barrica, mais coisa menos coisa e este ano conta já com o contributo de uma pequena percentagem de Vital (neste momento ronda os 10%). A prova desconcertou-me ligeiramente. Fiquei com a sensação de que o vinho perdera frescura nestes dias e tinha ganho mais volume de boca, mas para ficar mais plano e chato. Confesso que por momentos me passou pela cabeça que  não fosse o meu. Não que houvesse algo de errado, mas estava diferente daquilo que me lembrava e como é sabido, um grande enólogo nunca tem a culpa das merdas que acontecem ao vinho fruto das suas decisões. O grande enólogo, como eu, só é responsável pelo que corre bem.

Não vos quero maçar com detalhes e é difícil explicar-vos as aflições da treta pelas quais passa um enólogo hipocondríaco (que por acaso também o é na vida "real") de cada vez que um cabelo se desalinha nos seus preciosos vinhos. A verdade é que a sua acidez desceu para valores próximos das 6 gramas  (desceu mais de 1 grama depois de fermentado). Fiquei na duvida e trouxe uma amostra para casa que deixei a repousar no fim de semana. Hoje abri-a e servi-me daquela parte que já se apresenta translucida, com menor interferência das borras finas que se encontram em suspensão.
Gostei muito. O vinho mantém aquela secura que o Fernão Pires "verde" lhe imprime e está mais fresco (a levedura em suspensão faz com que os vinhos pareçam ter perdido muita acidez), mas apresenta um corpo mais consistente e uma maior complexidade aromática que sai do espectro dos citrinos e do malvado ananás que costuma ter em bebé. Ou seja,
apresenta uma paleta aromática mais rica e com mais descritores, mas baixou a intensidade aromática, o que a manter-se são muito boas notícias. Começo a acreditar que houve uma fermentação malolática (FML) parcial (ui... que complicação não é?) que acabou por enriquecer o vinho.
Devo afirmar que não sou fã de FML nos brancos. Gosto de frescura somada à complexidade que traz o tempo. Não gosto de apressar nada. Ninguém me tira da ideia que os Franceses a fazem por necessidade (não têm maturações perfeitas) e que nós, por conseguirmos ter a maturação que quisermos, não precisamos disso para nada.
Agora, se tiver sido isso que aconteceu (e já vou mandar o vinho para análise), terei de repensar a minha opinião ao longo do crescimento deste vinho.

Se podia ficar calado e falar apenas quando tivesse conclusões? Já viram a confusão que posso gerar na cabeça dos fregueses se amanhã ou depois vier para aqui dizer que afinal não houve FML nenhuma e que aquilo eram só gases? Que é como quem diz, precipitação tartárica motivada pela comb... (chato do caralho, cala-te porra!) 
Podia, pois podia, mas qual era a graça e a lógica de criar um projecto com pretenções a  "restaurante de cozinha à vista" e depois não vos relatar das minhas inquietude, incertezas e pequenos dramas de diva?
Não tinha graça, né?
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*nem manteiga, descobri que afinal minguem come castanhas assadas com manteiga, só eu. Um escândalo!